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O casal Tobias Framegas dos Reis e Cidália dos Reis Matos |
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Susana Matos Dias |
O funeral de Tobias Framegas dos Reis foi razão e tempo de homenagem e memória da neta Susana, na hora do adeus, no Cemitério Velho de Óis da Ribeira e a 8 de Setembro de 2025.
Assim e para memória futura:
O avô Tobias foi pai de quatro filhos - um deles, o meu pai, Óscar - e avô e bisavô dedicado, sempre presente e disponível para ajudar, com um coração do tamanho do mundo. Era um homem de gestos simples mas profundos, com um olhar atento e um cuidado e preocupação constantes por todos os que amava.
O seu nome, Tobias, carrega um simbolismo belo e adequado à sua vida: em hebraico, significa «Deus é bom».
E foi com essa bondade divina que ele viveu, amou, sofreu e cuidou dos seus.
Gostava imenso da sua terra, Óis da Ribeira, e era comum vê-lo a passear de bicicleta elétrica pelos caminhos tranquilos das margens da pateira nas tardes de domingo.
Era ali, entre o verde e o silêncio, que parecia encontrar um pouco de paz - ou talvez procurasse apenas tempo para pensar, recordar, sentir.
Gostava de jogar dominó e de beber um portinho na eira.
Tinha sempre uma história, uma lembrança, uma opinião a partilhar. Falava com saudade da sua esposa, a avó Cidália, companheira de uma vida inteira, e era impossível não ver no seu olhar a dor da ausência.
Sobreviveu a muito. Mais do que seria justo pedir a um só homem. Sobreviveu à dor, à perda, e à crueldade de lhe cortarem as duas pernas - mas nem isso lhe tirou a dignidade, nem o apagou da nossa memória como alguém forte, resistente, até ao fim.
Deu-me coragem para enfrentar a minha doença, a minha cirurgia, e partilhámos o medo de ir para uma mesa de operações, mas disse-me que «era para mim e que só eu podia enfrentar, para não ter medo, que ia correr bem».
Recordo com carinho as noites de Natal em que, com alegria, eu e o meu irmão Miguel preparávamos textos para ele e para a avó Cidália.
As suas expressões, os sorrisos, as gargalhadas, os olhos brilhantes….
Ficam connosco para sempre.
Como ficam os passeios no carro de mão, na carroça das vacas, as idas às suas terras, que apanhava caracóis para eu levar para os meus meninos e que arranjava sempre o que eu pedia para me ajudar a ter boa nota num trabalho da universidade - memórias que o tempo não apaga.
Durante os meses de Agosto, ficava algumas vezes a dormir em casa dos avós.
Cuidavam de mim com amor: compravam aquilo que eu mais gostava de comer, preparavam o pequeno-almoço com um carinho silencioso, mas evidente, e garantiam que cada refeição fosse um gesto de mimo e acolhimento.
Íamos juntos à festa da família, nas margens da pateira, esse encontro onde ele parecia tão feliz, rodeado dos seus, sorridente e orgulhoso.
Orgulhoso também da neta - e do percurso profissional que segui - e fazia questão de o dizer a toda a gente.
Falávamos da Banda Nova e sentia que ele valorizava verdadeiramente o meu trabalho, o meu esforço, a minha dedicação, em memória do meu avô Agostinho.
E entre todas essas memórias, estão também as visitas semanais a Óis da Ribeira, sempre nas folgas dos meus pais.
Mal chegávamos, sentia-se logo o cheiro da comida caseira e o calor de casa dos avós. Era tradição comer escoado - aquele sabor que só lá sabia bem - e, claro, os bifes com batatas fritas que a avó preparava com tanto carinho para os netos.
Nenhum restaurante podia competir com aquela mesa simples, mas feita de amor. Foi também com eles que aprendi a gostar de verdura.
Na altura, parecia estranho ver os adultos saborearem algo «verde», mas ali ganhei o gosto - talvez por sentir que tudo aquilo fazia parte do cuidado e do exemplo que nos deixavam.
Tinha um prazer genuíno em ajudar a comunidade. Lembro-me bem do seu envolvimento com a Tuna de Óis da Ribeira - sempre presente, sempre disponível.
E como esquecer os dias em que se assavam os leitões lá em casa?
O movimento, os cheiros, a azáfama da preparação… Tudo fazia parte daquele mundo que só se vive nas casas onde ainda se partilham as tradições.
Assisti ao matar do porco, uma das cenas mais marcantes da infância.
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Tobias F. Reis |
São tantas as recordações e peripécias… Dias cheios, em que tudo parecia uma aventura: o cheiro da terra molhada, os passeios, os risos à volta da mesa, a televisão a fazer companhia à noite a ver o «Preço Certo», a vaca – a amarela, as ninhadas dos leitões, as galinhas, as ovelhas, o quintal cuidado, as sacadas de fruta e de legumes que nos davam, os sabores que não voltam mas que ficam guardados em nós.
Óis da Ribeira é mais do que um lugar.
É o centro de uma infância rica em afetos, ensinamentos e histórias que ainda hoje me acompanham. Tive o privilégio de conhecer o avô Tobias, de crescer com o seu exemplo e amor. E farei questão de manter vivo o seu legado.
Tomarei conta do Óscar Augusto. Tomarei conta da Gabriela. E acompanharei sempre o Óscar Miguel. E tomarei conta de tudo aquilo que nos deixaste - em memórias, em ensinamentos, em amor.
Descansa em paz, Avô Tobias.
Ficarás para sempre no meu coração.
Susana
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Susana Dias (2012) |
A dissertação de mestrado intitulou-se «Identificação e intervenção nas dificuldades, preocupações e necessidades dos pais de bebés internados numa Unidade de Neonatologia». É formadora de Professores Certificada pelo CCPFC nas áreas e domínios B06 Educação Especial e C13 Sensibilização à Educação Especial.